Chamava-se Esmeralda...
Obrigo-me a tecer uma opinião ao comentário feito pela editora da "Revista Magazine", Sofia Barrocas. Esta autora sobre o caso Esmeralda/Ana Filipa escreve que "é provável que a razão e a lei estejam do lado do pai biológico", e abre então um parêntesis horripilante, "(temos de acreditar que sim, senão teríamos de deixar de confiar num dos pilares do Estado de Direito)", e continua dizendo que terá existido "alguma ingenuidade dos pais afectivos" pois, talvez os factos, "indicassem desde há muito este desfecho".
Ora, não posso ficar mais perplexa com semelhante comentário.
Ora, não posso ficar mais perplexa com semelhante comentário.
Primeiro porque na abertura do seu parêntesis, a autora dá uma machadada no que são para mim os direitos humanos, o direito a ser-se pessoa individual, e por fim, aos direitos das crianças. Isto porque, dar-se razão aos pais biológicos não deve nem pode ser comparado a algum tipo de direito de propriedade sobre a criança como se uma coisa/objecto fosse, sendo que isso será somente isso, uma coisa e não uma pessoa.
Depois refere-se a esta, diz a própria, "razão", como garantia de uma dos pilares do Estado de Direito. Digo eu, um dos pilares é, de facto, a família. Mas família no seu sentido abrangente, uma abertura da palavra ao seu conteúdo, enquanto garante da dignidade da pessoa humana e não a família biológica que, pode ser, e é-o infelizmente em muitos casos, a primeira a violar os direitos das crianças.
Por fim, refere-se a "ingenuidade" dos pais efectivos e eu pergunto? Porquê? Por acreditarem que Portugal enaltece os laços e não o sangue? Por que acreditam que pais são os que dão os valores e afectos essenciais ao desenvolvimento condigno de um ser humano ou porque a palavra "pai" é um quanto baste para se por termo à controvérsia de afectos entretanto desenvolvidos como, diria eu irónicamente, família? Por acreditarem no bem enquanto zeladores da protecção de um menor que a priori os pais BIOLÓGICOS não quiseram???
Isto sim deixa muito a desejar em termos de justiça. É por este, sempre presente, complexo sobre a paternidade, e por se ter a ideia errada de que paterno é sinónimo de dono e proprietário, que temos quanto aos pais biológicos, cada vez mais, e isto com conhecimento de causa, a entrada de processos, também eles, cada vez mais complexos, das chamadas crianças de risco.
Aqui entre nós, que pilar é este afinal que retira as bases de uma criança de 5 anos que apenas tem, no seio do seu cerne, a família, esta até então, com quem cresceu e com quem aprendeu a ter a percepção do seu eu?
Existirá o fantasma da adopção em Portugal para sempre?
Para quando o desburocratizar destes processos de acolhimento para depois não se darem o tira-e-retira de crianças aos seus entes, afectivos ou não, como se de coisas se tratassem?
Para quando a visão dos filhos, enteados, no fim, de crianças, como pessoas, concentradoras de direitos e garantias e não a visão destas como pertenças de alguém como se fossem meros objectos?
Entretanto o que esperar da JUSTIÇA SENÃO SOMENTE INJUSTIÇA?
E tudo isto se passa aqui tão perto, com toda a consternação que se possa sentir aqui entre nós pelos instrumentos que nos estão disponíveis para recorrermos e para se fazer a habitual, dizem eles, os agentes que a promovem... justiça!???
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